As Séries de Vinyásakrama e Āsanakrama nos Pūrvakrama-s do Método INatha: Fundamentos Filosóficos e Progressão Pedagógica.
- INatha

- 22 de ago.
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Resumo
Este ensaio delineia a fundamentação filosófica e semântica de um sistema pedagógico pertencente ao Método INatha, estruturado em cinco sequências de prática (Vinyāsakrama) inter-relacionadas e associadas a um conjunto de Āsanakrama Tradicionais do Hatha Yoga Natha, integrados ao sistema. O sistema proposto enraíza-se num módulo fundamental concreto (Maulika) que serve de base gênese para quatro módulos subsequentes, os quais são dedicados ao cultivo metódico de qualidades (guṇa) abstratas do ser: Expansão (Prasāritatā), Estabilidade (Sthiratā), Fluidez (Sarasatā) e Força (Balatā). A nomenclatura, rigorosamente extraída do léxico do Sânscrito clássico, visa transcender descrições meramente funcionais para orientar o praticante numa jornada de auto-investigação (svādhyāya) e transformação integral.
A Filosofia do Vinyāsakrama
O termo Vinyāsakrama (विन्यासक्रम), composto por vinyāsa (colocação inteligente) e krama (sequência, processo), refere-se a mais do que uma mera sucessão de āsanas. Denota um processo metódico de arranjo onde cada passo prepara, posiciona e conduz o praticante de forma segura e lógica para o seguinte, integrando essencialmente movimento e pausa com a presença consciente. Este ensaio explora a arquitetura de um sistema que emprega este método para cultivar estados de ser específicos, partindo de uma base fundamental para qualidades progressivamente mais sutis.
Introdução
No Método INatha, os Pūrvakrama-s constituem a espinha dorsal da pedagogia, promovendo uma transição gradual do Yoga Postural Moderno ao Haṭha Yoga Natha. Cada Pūrvakrama integra práticas de Āsana (āsana), Yoganidrā (yoganidrā), Bhāvana (bhāvana), Prāṇāyāma (prāṇāyāma), Samyama (samyama) e outros elementos, formando camadas progressivas de desenvolvimento físico, energético e mental.
O eixo de Āsana se desdobra em duas camadas paralelas e progressivas: o Vinyāsakrama (विन्यासक्रम), séries progressivas de movimento e pausa que preparam o corpo-mente, e o Āsanakrama (आसनक्रम), onde emerge o āsana propriamente dito, sustentado pela permanência (sthairya) e pelo Prāṇa Bandha Prāṇāyāma, selando a integração entre corpo e energia vital.
Os nomes de cada série de Vinyāsakrama não são meros rótulos funcionais: são conceitos-enigma (kaṭapayādi) enraizados na tradição sâncrita, que oferecem ao praticante chaves filosóficas para uma auto-observação ampliada. A dimensão física — fundamento, flexibilidade, mobilidade, estabilidade, força — é apenas a sombra de uma meta maior: cultivar consciência (cit) e integração (samāpatti) interior.
Cada Vinyāsakrama é um método progressivo para o cultivo das qualidades densas e sutis às quais o seu nome se refere.
1. O Alicerce Gerador: Maulika Vinyāsakrama (मौलिक विन्यासक्रम)
O termo मौलिक विन्यासक्रम (Maulika Vinyāsakrama) pode ser entendido a partir da decomposição dos elementos em sânscrito:
मौलिक (Maulika) Deriva de मूल (mūla) = raiz, base, fundamento, origem. O sufixo -ika indica “relativo a, que pertence a, essencial”. Assim, maulika significa “fundamental, essencial, original, primordial, basilar”.
विन्यासक्रम (Vinyāsakrama) É uma palavra composta:
विन्यास (Vinyāsa) = disposição, arranjo, ordenação, colocação em sequência, aplicação metódica (no contexto do yoga, costuma designar a coordenação entre movimento e respiração, mas, etimologicamente, é mais amplo: vi- = em detalhe, separadamente + nyāsa = colocar, depositar, organizar).
क्रम (Krama) = passo, sequência, ordem progressiva, método, processo gradual.
Portanto, विन्यासक्रम (Vinyāsakrama) significa “o método ou sequência ordenada de vinyāsas (disposições progressivas, arranjos coordenados)”.
Sentido do termo completo
Assim, मौलिक विन्यासक्रम (Maulika Vinyāsakrama) pode ser traduzido como:
“A sequência fundamental de vinyāsas”;
“O arranjo essencial progressivo”;
“O método basilar de disposições ordenadas”;
Em termos práticos no Yoga: “A série fundamental (ou raiz) de progressões de prática”.
Ou seja, é a estrutura primeira e essencial sobre a qual os demais vinyāsakramas se apoiam.
No Método INatha
Este Vinyāsakrama é mais que uma preparação; é a semente (bīja) de toda a consciência corporal posterior. É aqui que o praticante percebe o corpo não como um instrumento, mas como a raiz (mūla) da consciência encarnada, onde os alinhamentos primordiais, os padrões de respiração, as gestões energéticas e os pontos de focagem são estabelecidos como o vocabulário do diálogo interior.
2. Os Quatro Ramos de Cultivo de Qualidade (Guṇa)
no Vinyāsakrama
A partir do tronco Maulika, ramificam-se quatro sequências de prática, cada uma nomeada com um substantivo abstrato em -tā, denotando o estado ou qualidade a ser investigado e encarnado pelo praticante. Estes não são meros exercícios, mas laboratórios de auto-observação (svādhyāya).
a) Prasāritatā Vinyāsakrama (प्रसारितता विन्यासक्रम)
प्रसारितता (Prasāritatā)
É derivado da raiz verbal √सृ (sṛ) = fluir, expandir, mover-se, estender-se. Com o prefixo प्र- (pra-) tem o sentido de “adiante, para fora, intensivamente”.
Daí:
सारित (sārita) = estendido, expandido.
प्रसारित (prasārita) = amplamente estendido, expandido, alongado.
O sufixo abstrativo -ता (tā) forma substantivos de qualidade/estado:→ प्रसारितता (prasāritatā) = o estado de expansão, a qualidade de estar expandido, a condição de amplitude/extensão.
Portanto, prasāritatā significa “expansão, extensão, ampliação”.
Sentido composto
प्रसारितता विन्यासक्रम (Prasāritatā Vinyāsakrama) significa:
“O método sequencial da expansão”;
“A progressão ordenada da extensão”;
“A série de vinyāsas voltada para a experiência da expansão (do corpo, da respiração e da consciência)”.
No contexto do Yoga
Esse termo pode designar uma série de práticas cujo objetivo é gerar expansão:
No plano físico: expansão do corpo, abertura das articulações, alongamento.
No plano respiratório: expansão da respiração, ampliação da capacidade vital.
No plano psíquico e espiritual: expansão da consciência, abertura para dimensões mais sutis do ser.
Ou seja, é um vinyāsakrama cujo tema central é a experiência da expansão como qualidade existencial e espiritual.
Pedagogia no INatha
Este módulo visa superar a contração física (saṃkoça) como espelho da contração mental. Através de vinyāsas que enfatizam amplitude, o praticante é guiado a observar os limites da flexibilidade como fronteiras da experiência pessoal, praticando a não-violência (ahiṃsā) consigo mesmo. O objetivo é uma sensação de expansão do campo vital (prāṇamaya kośa), preparando o corpo-mente para a recepção de fluxos mais sutis de prāṇa.
b) Sthiratā Vinyāsakrama (स्थिरता विन्यासक्रम)
स्थिरता (Sthiratā)
Vem do adjetivo स्थिर (sthira), formado a partir da raiz verbal √स्था (sthā) = permanecer, estar firme, sustentar-se, ficar de pé.
स्थिर (sthira) = firme, estável, constante, imóvel, sólido, duradouro, fixo, tranquilo.
O sufixo abstrativo -ता (tā) indica estado ou qualidade.→ स्थिरता (sthiratā) = estado de firmeza, qualidade de estabilidade, condição de constância.
Logo, sthiratā significa “estabilidade, firmeza, equilíbrio, constância”.
Sentido composto
Assim, स्थिरता विन्यासक्रम (Sthiratā Vinyāsakrama) significa:
“O método sequencial da estabilidade”;
“A série progressiva que cultiva firmeza e equilíbrio”;
“O vinyāsakrama da estabilidade, constância e enraizamento”.
No contexto do Yoga
Esse termo se relaciona diretamente com o famoso aforismo de Patañjali:
“स्थिरसुखमासनम्” (sthira-sukham-āsanam, Yoga Sūtra II.46)→ “Āsana é postura firme (sthira) e confortável (sukha).”
Portanto, Sthiratā Vinyāsakrama pode ser entendido como uma série de práticas que desenvolvem a qualidade de firmeza física, estabilidade respiratória e equilíbrio psíquico-espiritual.
No corpo: posturas que enraízam, firmam a base, equilibram o eixo.
Na respiração: constância e ritmo estável do prāṇa.
Na mente: serenidade, ausência de agitação, firmeza na atenção.
Na consciência: permanência e imobilidade interior que prepara para o dhyāna.
Em suma, स्थिरता विन्यासक्रम (Sthiratā Vinyāsakrama) é o método progressivo do cultivo da estabilidade, no qual o praticante organiza corpo, respiração e mente em direção à firmeza, ao equilíbrio e à constância.
Pedagogia no INatha
Esta é a aplicação prática do aforismo de Patañjali: "Sthira sukham āsanam" (YS II.46). Através de āsanas de enraizamento e sustentações, cultiva-se a estabilidade física como base para a estabilidade mental (citta sthiratā).
O praticante é convidado a observar a oscilação fina entre estabilidade e instabilidade, não apenas no corpo, mas no fluxo dos pensamentos e emoções, cultivando a equanimidade.
c) Sarasatā Vinyāsakrama (सरसता विन्यासक्रम)
सरसता (Sarasatā)
O núcleo está em सरस् (saras):
Significa “lago, lagoa, fluidez, essência aquosa, vitalidade, suco, seiva”.
Também sugere frescor, beleza, vivacidade, graça.
Em sentido metafórico, saras está ligado ao sabor da vida, à fluidez criativa e à expressão estética.
Daí vem o adjetivo सरस (sarasa):
“cheio de seiva, suculento, vivo, gracioso, encantador, agradável”.
Com o sufixo abstrativo -ता (tā) → सरसता (sarasatā):
“a qualidade de ser vivo, suculento, fluido”;
“graça, frescor, encanto, expressividade, vitalidade criativa”.
Logo, sarasatā significa “graça fluida, frescor vital, expressividade estética, vivacidade do ser”.
Sentido composto
सरसता विन्यासक्रम (Sarasatā Vinyāsakrama) significa:
“O método progressivo da graça fluida”;
“A sequência de vinyāsas dedicada a cultivar frescor, vitalidade e expressividade”;
“A série ordenada que desperta o encanto e a vivacidade do movimento e da consciência”.
No contexto do Yoga
Um Sarasatā Vinyāsakrama enfatiza o aspecto estético, poético e expressivo da prática, ligado ao frescor e à seiva da vida.
No corpo: movimentos fluidos, harmônicos, cheios de leveza.
Na respiração: suavidade, frescor, continuidade.
Na mente: criatividade, alegria, espontaneidade.
Na consciência: contato com a beleza e a graça como manifestação do sagrado.
Esse termo pode se relacionar simbolicamente com Sarasvatī, deusa do fluxo do saber, da música e da inspiração. Assim, Sarasatā Vinyāsakrama poderia ser entendido também como “o krama que cultiva o frescor expressivo da consciência criativa”.
Em suma, सरसता विन्यासक्रम (Sarasatā Vinyāsakrama) é o método progressivo da graça e fluidez, onde corpo, respiração e mente se organizam em harmonia para expressar vitalidade criativa e beleza interior.
Pedagogia no INatha
Este módulo transcende a mera "mobilidade" para cultivar a não-resistência. Através de transições conscientes (vinyāsas) que ligam os āsanas de forma inteligente, o praticante observa a fluidez ou rigidez do movimento como reflexo direto do estado da mente. A meta é um movimento orgânico e econômico (prayatna śaithilya), onde a respiração é o condutor principal, integrando expansão e estabilidade num fluxo contínuo de consciência.
d) Balatā Vinyāsakrama (बलता विन्यासक्रम)
बलता (Balatā)
O núcleo é बल (bala):
Etimologia: da raiz verbal √bal / √balam = ser forte, vigoroso.
Sentidos principais: força, vigor, poder, energia vital, robustez, resistência, potência (física, psíquica e espiritual).
Em textos clássicos: bala é associado tanto à força física (deha-bala), quanto à força da mente (manas-bala) e à força espiritual (ātma-bala).
O sufixo abstrativo -ता (tā) indica qualidade ou estado → बलता (balatā) = a qualidade de ter força, vigor, potência.
Logo, balatā significa “força, vigor, potência, energia vital, robustez”.
Sentido composto
बलता विन्यासक्रम (Balatā Vinyāsakrama) significa:
“O método progressivo da força”;
“A série ordenada para o cultivo do vigor”;
“A sequência de vinyāsas dedicada a desenvolver potência e energia vital”.
No contexto do Yoga
Esse vinyāsakrama enfatiza o cultivo consciente da força em múltiplos níveis:
Físico: fortalecimento muscular, estabilidade estrutural, resistência corporal.
Respiratório: potência do prāṇa, vigor respiratório, expansão da capacidade vital.
Mental: firmeza da mente, clareza, determinação.
Espiritual: força interior (ātma-bala), coragem, capacidade de sustentar tapas (disciplina transformadora).
Nos Tantras e nos Yoga-śāstras, bala é também a força espiritual que sustenta o sādhaka diante das provações do caminho. Portanto, Balatā Vinyāsakrama não se limita ao aspecto físico, mas integra o cultivo de força vital e espiritual.
Em suma, बलता विन्यासक्रम (Balatā Vinyāsakrama) é o método progressivo da força e do vigor, no qual corpo, respiração e consciência são organizados para gerar potência interior, resistência física e estabilidade espiritual.
Pedagogia no INatha
Este é o módulo de tapas (disciplina ardente). Vai além do fortalecimento muscular para construir resiliência em todos os níveis. O praticante é levado a observar os limites da força e a descobrir a resiliência interior que surge perante o desafio. A prática inteligente envolve discernir o esforço vigoroso (sthira) da tensão desnecessária, cultivando uma força inteligente e não-violenta que servirá de suporte para as práticas de permanência do Āsanakrama.
3. A Suprema Consolidação: Āsanakrama Natha (आसनक्रम नाथ)
O terceiro eixo inaugura a manifestação plena do āsana. Aqui, a progressão já não é mais de vinyāsa (movimento e pausa), mas de āsana (permanência). As Séries Natha de Āsanakrama representam a culminância dos Pūrvakrama-s, introduzindo a prática tradicional caracterizada por:
Permanência estável e progressiva no āsana.
Integração progressiva do Prāṇa Bandha Prāṇāyāma, técnica avançada que sela o corpo-energia (prāṇamaya kośa) e expande a consciência para além da forma física.
Transição da consciência do corpo físico (annamaya kośa) ao corpo energético, onde o āsana se torna um gesto de estabilidade organizadora dos fluxos de prāṇa.
Mesmo em seu caráter preparatório, o Āsanakrama no Método INatha já coloca o praticante diante da essência do Haṭha Yoga Natha: o āsana como campo de permanência, expansão da consciência e realização da unidade (yoga) entre corpo e prāṇa.
Conclusão
A progressão de Vinyásakrama e Āsanakrama nos Pūrvakrama-s do Método INatha não é meramente física, mas um itinerário de auto-observação filosófica e meditativa:
Maulika Vinyāsakrama – perceber o corpo como raiz (mūla) e templo da consciência.
Prasāritatā Vinyāsakrama – observar os limites da flexibilidade como fronteiras da experiência e praticar a expansão sem violência.
Sthiratā Vinyāsakrama – observar a oscilação entre estabilidade e instabilidade para encontrar a quietude do movimento.
Sarasatā Vinyāsakrama – observar a fluidez ou rigidez do movimento como reflexo da mente, cultivando a economia de esforço e a graça.
Balatā Vinyāsakrama – observar os limites da força para descobrir a resiliência interior e o poder da disciplina consciente.
Āsanakrama Natha – transcender o movimento e adentrar a permanência do āsana, integrando prāṇa e consciência para realizar a unidade.
A dimensão física é o pano de fundo, a essência é a expansão da consciência a partir do corpo. Assim, cada série se revela não apenas como treino do corpo, mas como um laboratório filosófico (darśana śālā) e meditativo para a jornada do Yoga Natha, guiando o praticante da periferia do movimento ao centro silencioso da permanência.
Bibliografia
Fontes Primárias:
PATAÑJALI. Yogasūtra. [S.l.: s.n.], c. século IV a.C.
SVĀTMĀRĀMA. Haṭhayogapradīpikā. [S.l.: s.n.], c. século XV.
Gheraṇḍasaṃhitā. [S.l.: s.n.], c. século XVII.
Fontes Secundárias (Dicionários e Gramática):
MONIER-WILLIAMS, Monier. A Sanskrit-English Dictionary. Oxford: Clarendon Press, 1899.
APTE, Vaman Shivaram. The Practical Sanskrit-English Dictionary. Poona: Prasad Prakashan, 1957.
Fontes Secundárias (Estudos do Yoga e do Método INatha):
IYENGAR, B. K. S. Light on Yoga. New York: Schocken Books, 1979.
SRIVATSA, Ramaswami. The Complete Book of Vinyasa Yoga. Cambridge: Da Capo Press, 200.
[INSERIR REFERÊNCIAS ESPECÍFICAS DO MATERIAL DIDÁTICO DO MÉTODO INATHA AQUI, SE APLICÁVEL]


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